sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Uma viagem ao desconhecido

 “Temos o destino que merecemos. O nosso destino está de acordo com os nossos méritos”. Albert Einstein

“O fracasso quebra as almas pequenas e engrandece as grandes, assim como o vento apaga a vela e atiça o fogo da floresta”. Benjamin Franklin

“Conhecer o homem - esta é a base de todo o sucesso”. Charles Chaplin

Texto de referência: “Escrécio, cadê você?” Dezembro de 2016

 

Era esse o ano: 2016. Neste ano, o Brasil passava por mais uma de suas crises, escândalos políticos, além de suas sucessivas crises financeiras. Mas mesmo assim, como todo bom brasileiro, existia um ser que vivia no Centro-oeste do país que acreditava em mudanças, principalmente na melhora de sua vida. Eis que o chamarei de Otávio .

Otávio, desde bem pequeno, ouvia seus pais e parentes dizerem que o caminho de ser bem sucedido passava pelo estado de São Paulo, necessariamente. Era lá que havia uma população mais rica e com melhores “conceitos”. E assim, nessa concepção cresceu essa manipulada criança.

Dessa forma, ao completar os seus 17 anos, Otávio, que morava na agitada cidade de Barra do Garças – MT, decidiu que precisava, o quanto antes, embrenhar-se na região paulista. E assim sucedeu-se. Essa foi a primeira tentativa de morar no referido Estado.

Juntamente com o vago pensamento de residir-se em São Paulo, acreditava que tinha de tornar-se independente financeiramente o mais rápido possível, então decidiu estudar muito e seguir carreira militar, e já no ano de 2005 iniciou a tal carreira. Infelizmente descobriu que não tinha nada a ver com a profissão e decidiu desistir. Desta forma, fora estampado seu primeiro fracasso.

De volta às origens, ou seja, no Estado de Mato Grosso, ficou totalmente fatigado e indignado, pois não se sentia bem, voltou com seu intento de expandir seus horizontes e foi para Goiânia – GO. Na capital goiana, no ano de 2008, estudou novamente para uma carreira profissional. Dessa vez, fez prova para PRF.

Umas das maiores surpresas de sua vida fora ter reprovado no exame psicotécnico do concurso da PRF, o que o levou ao “fundo do poço” emocional. Por um tempo, não acreditou mais em seus potencial. Mas como uma pessoa resiliente, decidiu tentar novamente.

Em 2012 teve uma nova oportunidade para mudar-se para Goiânia e assim o fez. Foi trabalhar no Ministério da Saúde. Nesse momento de sua vida, a pedido de sua mãe, considerou que teria que ter uma faculdade para progredir, e formou-se em Direito.

Porém, mais uma vez, sentiu-se imbuído de um sentimento de cobrança e de necessidade de testar seu limite. Assim, Otávio decidiu enfrentar a prova da OAB e tornar-se um advogado. No fundo havia um certo temor em tentar mudar tudo, mas outros aspectos o encorajou, como a doença de sua irmã e o nascimento de seu filho.

Voltamos agora ao ano referido no início da narrativa, 2016. O raciocínio que Otávio seguia era o seguinte: - vou largar tudo, pois sou muito capaz de ganhar o bastante para viver de forma autônoma. Acreditava também que dessa vez merecia algo melhor, a vida lhe devia, e, quem sabe, apareceria alguém para lhe ajudar. Essa pessoa tinha até nome, Escrécio. E assim decidiu.

Era o momento ideal para realizar seu grande sonho, que era definitivamente morar no interior de São Paulo, já que era o único jeito de sentir-se bem sucedido. A cidade escolhida foi São José do Rio Preto – SP, em razão de seu alto índice de desenvolvimento humano (IDH).

Já para iniciar sua nova trajetória, ficou três meses sem emprego, acabando de desistir da ideia de advogar naquele momento e arranjou um emprego como auxiliar administrativo na OAB. Pensou que já estava bom, pois seria uma oportunidade. Mas não foi bem assim. Nessa instituição foi obrigado a lidar com profissionais não muito simpáticos, os advogados. Uma de suas primeiras ordens a cumprir foi fazer café duas vezes ao dia, sendo uma "porrada" no seu ego, mas executou a tal ordem.

Aguardou uma oportunidade real na profissão, mas nada ocorreu. Seria o momento de largar tudo novamente, com filho para criar, um casamento para sustentar? Muitas foram as dúvidas, mas era como se não tivesse escolha, e decidiu advogar como autônomo em 2017.

Muito labutou o pobre Otávio. Os processos não andavam, tudo demorava muito e veio a grande Era: a pandemia da Covid19. Para ele o sonho acabou, sendo bastante breve e resumido. O desespero foi total. Otávio precisou fazer uma escolha muito cruel, sendo a de voltar ao serviço público, diante da realidade que o cercava, porque naquele momento, o que ele mais sabia era estudar.

Porém, concurso em São Paulo não é brincadeira de criança. Otávio teve que contentar-se com um serviço em Prefeitura com um salário parco. Esse serviço não foi o bastante financeiramente, teve então que desistir do serviço público. Foi motorista de aplicativo, garçom e gerente de restaurante, trabalhando arduamente.

A ideia de advogar havia se tornado distante, e, até mesmo, indesejável. Passado a pandemia, e já bem mais maduro, já divorciado, já casado novamente, já tolhida a presença de seu filho morando em outro país, viu-se calmo. Com um forte desejo de ter se conhecido mais, tido mais tempo para si mesmo.

Percebeu que já não importava mais a insígnia profissional, o valor de seu salário, isso começou a parar de perturbar lhe. E assim, iniciou uma severa reflexão sobre sua vida. Qual realmente foi o seu sucesso, a sua conquista? Embora sejam de diferentes escalas, todo ser humano tem a sua conquista.

A conclusão de Otávio de sua conquista foi aquele sonho de conseguir alcançar um lugar em que não se sente tão cômodo, onde o trabalho e os objetivos são mais severos. No lugar em que as pessoas não poderão te ajudar como pensava. Um lugar que é mais você e sua força de vontade.

E esse lugar ele acreditava que enfim tinha sido conquistado. Muitos não irão entender essa vitória, porque para os que nasceram nesse Estado mais próspero, vivem no seu berço, ou seja, em seu lugar cômodo e conhecido. Mas mal sabem eles o quão é difícil para um forasteiro, sem raiz, fazer o seu lar em um lugar tão competitivo, com tamanha densidade demográfica.

De tudo que passou, fica uma indignação relutante na mente de Otávio, o qual (ainda) não entende por que é tão difícil entender-se a si próprio. Mas uma certeza reverberou, de um sentimento de fracasso, surgiu uma esperança, um sentimento de conquista verdadeira e sincera. Ele se sente em casa, (em um lugar cômodo e conhecido), sente-se inserido com pessoas que transmitem confiança e que partilham de seus valores. Ele agradeceu ao universo pela oportunidade de ter vencido e (poder) continuar (resiliente) em sua caminhada.